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24 de julho de 2007

Pocilga Literária

O ofício de trabalhar com tinta tem algo de porco. A proximidade com algo que mancha, borra... Sobretudo o escritor, que trabalha com o absurdo e a desgraça da condição humana, filtrando os detritos da sociedade. Tento melhorar o papel em branco, mas enquanto o faço, às vezes, sinto que estou fazendo somente gastar tinta e sujá-lo, mas continuo escrevendo; parece-me que lanço uma quantidade infinita de signos na página, cada um deles um argumento, cada palavra querendo discordar inutilmente do nada, do vazio do papel. A estúpida suposta pureza do branco entre linhas finas é dado, é o anfitrião, e o escritor é o visitante rude e agressivo que discute acaloradamente com ele, o primeiro é calado e ataráxico, argumenta apenas com seu silêncio sereno e pacífico, e o segundo é um ignorante falastrão que nunca quer ceder e que só acha que convence pela violência barulhenta das letras e dos fonemas, agride-o com tinta. Quando o redator se cansa e vê o que fez, percebe que só fez sujeira, um servicinho asqueroso e nojento, com seus garranchos ele embute na página com extremo exagero seus desconexos argumentos: pensamentos gordurosos e miudezas estéticas encobertos por uma fina película de incapacidade intestina. A página ainda assim contem mais branco do que tinta, o que o motiva a recomeçar. Carrega nas tintas. Literatura é uma porcaria, escreve bem quem melhor sabe encher lingüiça.